Delação da JBS: entenda a reviravolta no caso
Delação da JBS: entenda a reviravolta no caso
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fez na noite de segunda-feira 4 um pronunciamento às pressas no qual anunciou uma nova investigação a respeito das atividades de Joesley Batista, um dos donos da holding J&F, proprietária da JBS, e de Ricardo Saud e Francisco de Assis e Silva, executivos da empresa. Ambos realizaram acordos de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República que embasaram, por exemplo, a denúncia por corrupção contra o presidente da República, Michel Temer.
A nova investigação não anula as provas entregues pelos delatores, mas cria um novo debate político a respeito da legitimidade das delações. Entenda o caso.
O que Janot anunciou na segunda-feira 5?
Janot determinou a abertura de um procedimento administrativo para revisar os acordos de delação de Joesley Batista, Saud e Assis e Silva. Os três integram o grupo de sete executivos da J&F que firmaram acordo de delação premiada.
Por que só agora Janot pediu essa nova investigação?
Porque avaliou que a última leva de documentos entregues pelos delatores traz indícios que precisam de investigação. Esse material foi entregue em 31 de agosto, último dia do prazo de 120 dias, a partir da homologação da delação, para que os colaboradores entregassem elementos de provas sobre os depoimentos prestados em abril.
E por que será realizada uma nova investigação?
Porque nos áudios entregues pela J&F há um áudio com “cerca de quatro horas de duração”, segundo a PGR, que traz uma conversa entre Joesley e Saud com “elementos que necessitam ser esclarecidos”.
Há mesmo ministros do STF citados?
Sim, mas ainda não se sabe quantos, quais e qual o eventual grau de gravidade das citações. Em seu site oficial, a PGR afirmou que na conversa entre Saud e Joesley há “meras elucubrações, sem qualquer respaldo fático, inclusive envolvendo o Supremo Tribunal Federal e a própria Procuradoria-Geral da República”, mas destaca os tais “elementos” que precisam de esclarecimento.
No despacho enviado por Janot ao STF, no entanto, o PGR fala de “trechos no áudio que indicam a omissão dolosa de crimes praticados pelos colaboradores, terceiros e outras autoridades, envolvendo inclusive o Supremo Tribunal Federal.
E Janot citou algum elemento concreto que exige investigação?
Apenas um. É o caso do ex-procurador da República Marcelo Miller, que integrou a força-tarefa da Lava Jato em Brasília e, depois, foi trabalhar no escritório Trench, Rossi e Watanabe, contratado pela J&F para negociar com as autoridades o acordo de leniência da companhia, uma espécie de delação premiada para empresas.
Segundo Janot, o áudio dá a entender que Miller estaria auxiliando na confecção de propostas de colaboração para serem fechadas com a PGR, o que poderia configurar crime de improbidade administrativa.
E como vai se dar essa investigação?
Janot determinou que até a sexta-feira 8 Joesley Batista, Saud e Assis e Silva prestem novos depoimento à PGR, em Brasília, para esclarecer as dúvidas dos investigadores. Eles também deverão apresentar o equipamento no qual a gravação foi feito, bem como os dispositivos onde os áudios estavam armazenados.
Marcelo Miller foi intimado a comparecer à PGR, também até sexta-feira 8, para prestar depoimento sobre sua atuação. O escritório Trench, Rossi e Watanabe, para o qual Miller trabalhou após deixar a PGR, deverá apresentar informações sobre a demissão de Marcelo Miller e de Esther Miriam Flesch, outra advogada da banca e que foi recentemente desligada da sociedade.
O áudio é público?
Por enquanto, não. Em seu despacho, Janot encaminha o áudio ao relator da Lava Jato no STF, o ministro Edson Fachin, e afirma que é ele quem deve decidir “sobre sua publicidade ou não, considerando que, embora a Pet 7003 [a ação que envolve a J&F] seja pública, o mencionado áudio, além de apresentar supostos crimes, também revela diálogos da intimidade dos interlocutores e de terceiros”. Fachin ainda não se pronunciou.
E a delação premiada da J&F pode ser anulada?
Não. Segundo a PGR, uma eventual revisão do acordo não implica nulidade de provas já produzidas em investigações. Pode haver, no entanto, reflexos na “premiação” da delação, inclusive com a perda total dos benefícios.
Janot estava prestes a denunciar Temer novamente. E agora?
Em tese, nada muda, e o PGR ainda pode denunciar o presidente da República. Ocorre que o caso, ainda que tornado público pelo próprio Janot, enfraquece o procurador politicamente. Isso porque desde o início do escândalo, Temer construiu sua defesa atacando a credibilidade de Joesley Batista e salientando o papel de Marcelo Miller, o qual Janot, inicialmente, disse não ser ilegal.
Na China, onde participa de encontro dos BRICS, Temer disse que recebeu as notícias sobre a delação de Joesley “com serenidade”.
Por Carta Capital